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12/12/2012 Revista IstoÉ

Morandi Iluminado


Conhecido pelas naturezas-mortas com garrafas, o italiano Giorgio Morandi ganha retrospectiva em Porto Alegre, onde se revela um pintor fascinado pela luz

Durante anos, o italiano Giorgio Morandi (1890-1964) teve na vista da janela de sua casa, localizada na rua Fondazza, em Bolonha, a sua maior inspiração. Foram repetidas as vezes que o pintor retratou a paisagem que dali mirava, mas o que mais o fascinava no cenário era a luz: imanência imprescindível para que o artista criasse sua paleta de cores pastel, que, para além de suas naturezas-mortas com garrafas, se tornou sua marca registrada. E, para que a luz fosse perfeita, Morandi organizava seu ateliê com um rigor espartano e minimalista, posicionando cada móvel e ferramenta de trabalho como um caçador se preparando para capturar uma presa rara. “Morandi era extremamente metódico, para ele a realidade era transcendida pela observação e tal realidade nunca esteve além da aparência das coisas”, explica Lorenza Selleri, curadora da mostra “Giorgio Morandi no Brasil”, em cartaz na Fundação Iberê Camargo, e também a responsável pelo arquivo do Centro de Estudos Giorgio Morandi do Museo Morandi, que cuida do espólio do artista.

Em vida, esse pintor, cujas pinceladas nunca registraram uma figura humana, foi retratado pelos mais célebres fotógrafos, dentre eles seu renomado compatriota, Luigi Ghirri, que fotografou o ateliê logo após sua morte, em 1964. Ampliadas em grandes dimensões, as três fotografias de Ghirri que reproduzem o ambiente de trabalho de Morandi são o ponto final e de suma importância para se compreender a exposição inédita que traz ao País 55 obras do pintor italiano. Do início da carreira do artista, que se associou brevemente ao movimento da pintura metafísica, liderado por Giorgio de Chirico, três naturezas-mortas produzidas entre 1919 e 1921 dão o ponto de partida na mostra, organizada de maneira cronológica. “Dado o percurso do pintor, apesar de suas pinturas buscarem certo abstracionismo da realidade, ele esteve mais próximo de uma pintura existencial do que metafísica”, comenta Lorenza.

A principal evidência do existencialismo de Morandi está nas pinturas realizadas durante o período da Segunda Guerra Mundial. Embora tenha sido um admirador profundo de Pablo Picasso, ao contrário do espanhol que expressou sua revolta no marcante e hiperbólico “Guernica”, Morandi se voltou a paisagens pequenas e intimistas, mas de expressão trêmula e cores tristes. Foi também grande admirador do pintor Paul Cézanne. Mas, diferentemente de outros pintores que deixaram suas cidades, países e lares e migraram para a universal Paris no início do século XX, Morandi só conheceu a capital francesa no final da vida. Talvez por isso seu reconhecimento tenha sido um tanto tardio.

O artista marcou profundamente uma grande geração de pintores brasileiros, entre eles o próprio Iberê Camargo, que, em uma mostra paralela organizada pela Fundação Iberê Camargo, “O ‘Outro’ na Pintura de Iberê Camargo”, se mostra influenciado pela arte de Morandi. Além de um pintor metódico, o artista foi também um exímio gravador. Participou de três Bienais de São Paulo, em 1951, 1953 e 1957, ganhando o Primeiro Prêmio de Gravura na edição de 1953. A mostra em Porto Alegre traz agora 15 gravuras dessa série premiada. Outro destaque é a recriação da Sala Especial que o artista ganhou na Bienal de São Paulo, de 1957, que deu a ele o Grand Prix de Pintura. A exposição traz três pinturas que Morandi apresentaria naquela edição da Bienal, mas cujos empréstimos foram negados pelos proprietários das obras, na ocasião. “Natura Morta” (1931), “Natura Morta” (1955) e “Paesaggio con Strada Bianca” (1941) mostram o artista em fase amadurecida e de estilo estabelecido. “Mesmo tendo lhe dado o prêmio, há 55 anos, os brasileiros terão a oportunidade de ver como a Sala Especial teria ficado e compreender toda a evolução de um dos artistas mais importantes do último século”, finaliza a curadora que também selecionou o documentário “La Polvere di Morandi” para completar essa que é a maior retrospectiva do artista já realizada em território brasileiro.

Fundação Iberê Camargo



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