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08/08/2014
Fundação Iberê Camargo traz ao Brasil exposição inédita sobre Arte Povera
“Limites Sem
Limites. Desenhos e Traços da Arte Povera” é a primeira grande mostra realizada
no País dedicada a um dos mais emblemáticos movimentos artísticos italianos da
segunda metade do século XX. Com curadoria de Gianfranco Maraniello, a Arte
Povera foi explorada pelo viés do desenho e terá 25 obras de 12 artistas,
incluindo um trabalho inédito desenvolvido especialmente para a Fundação. A
visitação acontece de 22 de agosto a 2 de novembro de 2014.
Porto Alegre é a primeira
cidade brasileira a receber uma grande exposição dedicada à Arte Povera (Arte
Pobre, em tradução livre), um dos mais emblemáticos movimentos artísticos
italianos da segunda metade do século XX. Limites Sem Limites. Desenhos e
Traços da Arte Povera, a quinta mostra do calendário de 2014 da Fundação
Iberê Camargo, apresentará, pela primeira vez na história, um recorte que
revela como os artistas do movimento entenderam a prática do desenho.
O norte conceitual da
exibição foi escolhido pelo curador Gianfranco Maraniello, diretor do MAMbo –
Museu de Arte Moderna de Bolonha. De 22 de agosto e 2 de novembro, o terceiro e
o quarto andares da Fundação, além do vão do átrio, serão ocupados com 25 obras
de 12 artistas do grupo original da corrente artística que, no final da década de 1960, quando a Itália havia acabado de se
recuperar dos efeitos devastadores da Segunda Guerra Mundial e passava por
grandes transformações sociais, tentaram quebrar a dicotomia entre a
arte e a vida, principalmente através da criação de instalações feitas a partir
de materiais do cotidiano.
Para Maraniello, filósofo
e ex-professor da Academia de Belas Artes de Brera (Milão), a Arte Povera,
assim como os happenings, a arte performática e a Land Art, foi
marcada pela desconstrução dos mitos de uma modernidade que alienou o homem da
sua produção. “O movimento consistiu em uma redução linguística, um
‘empobrecimento’ dos signos no sentido do retorno ao essencial, uma tentativa
de libertação do acúmulo conceitual da tradição”, diz o curador. Em um período
dominado pela pintura abstrata, pela Pop Art e pelo Minimalismo, que apesar das
propostas radicais, se mantiveram apresentando formas esculpidas e visuais, os
artistas da Arte Povera ultrapassaram os limites da pintura e da escultura por
meio do uso de materiais que mudam ao longo do tempo, enferrujam e apodrecem.
“A adoção de vegetais, minerais brutos, fogo e eletricidade como matéria-prima
determinou a estética do grupo, que tinha como foco o caráter provisório da
obra, e a sua disponibilidade de ser reconhecida para além de seus limites
físicos”, observa Maraniello.
“A exposição em Porto Alegre é a primeira pesquisa sobre o que acontece
quando os protagonistas da Arte Povera têm a intenção do desenho”, afirma o curador,
que confessa ter se surpreendido com o que descobriu ao longo do processo de
concepção da mostra. Não se trata de uma retrospectiva, mas sim de um ensaio
sobre como esta prática do desenho, que normalmente inscreve um espaço, foi
repensada pelo grupo de forma a ultrapassar os limites da própria obra. Cada um
dos artistas do núcleo explorou o gesto de desenhar de uma forma particular,
envolvendo o público como elemento ativo e participante. “Em frente ao
trabalho, tornamo-nos parte da obra. É com este espírito que o espectador deve
se aproximar de todas as instalações e desenhos da exposição, porque cada um
deles, é capaz de romper os limites de si mesmo e estimular a nossa
imaginação”, completa Maraniello.
Para
Fábio Coutinho, superintendente cultural da Fundação Iberê Camargo, a Fundação
cumpre mais uma vez com o seu papel de trazer ao Brasil mostras, obras e
recortes inéditos das artes visuais. Assim como fizemos com vários
artistas nacionais e internacionais, como William Kentridge: Fortuna,
e com curadorias inéditas de Iberê Camargo, estamos proporcionando ao público
uma exposição de grande importância histórica e conceitual”, diz Coutinho.
As obras
Ao
iniciar a visita pelo quarto andar da Fundação, o público encontrará
instalações de Luciano Fabro (1936-2007). Em uma delas, “Groma Monoteista”
(1984-2005), o artista reconstitui uma groma, instrumento arcaico utilizado
pelos romanos para medir campos. Nas hastes do grande objeto, que mede mais de dois metros de altura, são dependurados símbolos das religiões
monoteístas, num trabalho que lida com a relação entre a marcação de
fronteiras, os desenhos de territórios, e os determinantes culturais. Ao lado
desta obra, estarão uma tela de Pino Pascali (1935-1968), “Torso di Negra”
(1964-65) – uma superfície monocromática que se delineia graças às
protuberâncias provocadas por câmaras de ar, exibindo figuras aleatórias que se
revelam a partir dos desenhos que evocamos na nossa mente –, e desenhos de
Emílio Prini (1943-), compostos de caracteres escritos à máquina e impressos no
Brasil de acordo com instruções do artista.
Um dos
mais aclamados artistas do movimento, o grego Jannis Kounellis (1936) – o único
não italiano do núcleo –, estará representado por dois trabalhos na segunda
sala deste piso. Em uma das obras, de 1988, uma barra de ferro e uma placa de
metal são “sustentadas” por um desenho, colocadas sobre ele, de forma a
redefinir as relações entre o suporte e o conteúdo do quadro. Na mesma sala
estará uma instalação de outro grande expoente da Arte Povera, Michelangelo
Pistoletto (1933). “Il disegno dello Specchio” (1979) consiste em uma série de
espelhos cortados em diferentes formatos, que refletem partes do mundo em
movimento em suas silhuetas. “Não se trata, portanto, de uma representação, mas
sim de um dispositivo sempre aberto, capaz de acomodar em sua superfície o
mundo em mudança, uma realidade que está sempre ativa, e que se torna visível e
sempre renovada aos olhos de todos nós”, destaca o curador. Ao lado desta obra
estará um conjunto de telas de Alighiero Boetti (1940-1994), feitas de
coordenadas numéricas sobre papel quadriculado que acabam se tornando
emaranhados geométricos.
No mesmo
andar, serão apresentadas obras do casal Mario Merz (1925-2003) e Marisa Merz
(1926). Ela, a única mulher integrante do movimento, mostrará uma composição de
delicados desenhos e uma instalação de malhas de cobre permeáveis à luz,
capazes de projetar sombras e envolver a arquitetura do espaço expositivo na
obra. As intervenções dele também interagem com o ambiente. Em uma delas, de
1997, sete animais criados em papel e com materiais luminosos, como sombras de
representações pré-históricas que se libertam no espaço, serão colocadas na
rampa que leva os visitantes do quarto andar ao terceiro andar da Fundação.
Como comenta o curador, “Merz não circunscreve a obra no interior do perímetro
de uma folha, mas produz uma contínua ruptura da gramática expositiva,
extrapolando das formas convencionais de produção artística e da codificação
dos lugares considerados pertinentes para a arte".
Seguindo
a visita, no terceiro andar, o público visualizará quatro obras de Giulio
Paolini (1940). Uma parte de “Aula di disegno” (Happy Days, 2006-2014) será
desenhada diretamente na parede do prédio pelo assistente do artista. Trata-se
da representação de uma sala. Como diz Maraniello, “com essa estratégia, as
dimensões ambientais da obra constituem uma geometria imersiva para o
visitante, entregue à própria posição de espectador e, simultaneamente, de
possível personagem na cena aparentemente figurada”.
Outra
obra que contará com a participação de um montador italiano intervindo nos
espaços da Fundação Iberê Camargo é “Oltremare” (1978-2014), uma das duas
produções de Giovanni Anselmo (1934) que serão apresentadas em Porto
Alegre. É deste artista também a obra “Il panorama com mano che lo
indica” (1980), composta por uma pedra sobre o chão e, acima dela, pelo desenho
de uma mão que aponta para o espectador, devolvendo a ele o ato de olhar. “É
como se a obra nos re-olhasse”, comenta o curador.
A
experimentação com materiais alternativos, eletricidade e processos químicos é
marca do trabalho de Gilberto Zorio (1944), que terá três obras expostas no
terceiro andar, seguindo a ordem da visitação. Elas são compostas por pares de
desenhos dependurados que se completam na interação com o espaço, pelas
variações de luz. “Disegno Torre Stelle” (2012), por exemplo, que é um desenho
feito sobre papel impregnado de fósforo e outras substâncias fluorescentes,
necessita receber
dez minutos de luminosidade para, por um minuto,
revelar as formas de uma estrela. Em relação ao trabalho de Zorio, Maraniello
destaca que “a arte não permanece ancorada na própria certeza diurna e na
estabilidade da obra. Ela pertence ao mundo, animada pelos mesmos componentes
orgânicos e químicos que tudo transformam, e que o homem tenta conter na
arbitrária imaginação de processos figurativos da mente”.
É deste
artista também a instalação inédita apresentada na exposição, que ficará
suspensa no vão do átrio: Um cabo de aço que, em suas curvas, tem desenhada a
palavra “ódio” (Odio, 2014). Nos sulcos do chumbo de que a palavra é feita, é
possível enxergar o entrelaçado de fios de cobre, um dos materiais
privilegiados pelo artista por sua capacidade de condução. Construída sobre o
conflito entre a leveza do objeto e o perturbador substantivo, a obra foi
pensada especialmente para esta exposição.
O trabalho de grandes
dimensões de Giuseppe Penone (1947), “Trappola di Luce” (1988), que ocupará
toda a parede da última sala da mostra medindo quase dez metros de largura,
encerra a visita. O artista lida com as possibilidades do carvão em suas
diferentes formas, inclusive cristalizadas, para criar barras como se fossem
ramos de uma figueira e de sabugueiro.
Mais
sobre o movimento artístico
O
termo “Arte Povera”, derivado do “Teatro Pobre” teorizado por Jerzy Grotowski,
foi usado pelo crítico de arte Germano Celant em 1967 para descrever o grupo de
artistas italianos que, a partir do final dos anos 1960, tentaram quebrar a
dicotomia entre a arte e a vida, principalmente através da criação de
instalações feitas a partir de materiais do cotidiano. A primeira exposição de
Arte Povera foi realizada na Galleria La Bertesca, em Gênova, em 1967.
Posteriormente, o grupo realizou mostras em cidades como Bolonha e Amalfi. Em
geral, o trabalho dos artistas é caracterizado por composições de objetos
aparentemente desconexos. É o caso de “Vênus dos Trapos” (1967), de
Michelangelo Pistoletto, que coloca uma estátua de jardim da deusa romana
diante de uma pilha de trapos que podem ser interpretados como os detritos da
sociedade moderna. A Arte Povera também se relaciona com o momento político de
sua época, que culminou com os protestos estudantis de 1968. Isto é evidente em
obras como a irônica “Itália
Dourada” (1971), de Luciano Fabro, que consiste em um mapa da Itália feito em
bronze dourado pendurado de cabeça para baixo. Além de expressar interesse em
questões sociais, o grupo estava preocupado com a criação de diversas formas de
interação física entre a obra de arte e o seu espectador. Em 1971,
Germano Celant decretou o fim do movimento em favor da experiência de cada um
dos artistas, que vieram a desenvolver percursos específicos com distintas
sensibilidades quanto às práticas e ao uso de materiais.
Mais
sobre o curador Gianfranco Maraniello
Gianfranco Maraniello (1971) é o
diretor do MAMbo – Museu de Arte Moderna de Bolonha. Ele foi curador do Museu
de Arte Contemporânea de Roma e da Bienal de Shangai em 2006. Curou inúmeras
exposições na Itália e em prestigiados museus internacionais. Interessado nos
pontos de virada linguística da arte contemporânea, lidou frequentemente com a
nova vanguarda que emergiu na Europa na segunda metade dos anos 1960, criando
mostras como Arte Povera 1968 (com Germano Celant) e relevantes
monografias dos protagonistas do movimento como Giovanni Anselmo, Giuseppe
Penone e Gilberto Zorio. Editou a coleção “Giuseppe Penone. Writings 1968 –
2008”.
SERVIÇO
O QUE | Exposições Limites sem Limites.
Desenhos e Traços da Arte Povera
ABERTURA | 21 de agosto de 2014, das 19h às 21h
VISITAÇÃO | De 22 de agosto a 2 de novembro de
2014
ONDE | Fundação Iberê Camargo, Av. Padre
Cacique, 2000, Porto Alegre – RS
HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO | De terça a domingo (inclusive
feriados), das 12h às 19h, (último acesso 18h30) quintas até às 21h (último
acesso 20h30)
ENTRADA FRANCA | As empresas Gerdau, IBM, Itaú, Vonpar
e Banco Votorantim garantem a gratuidade do ingresso
SITE | www.iberecamargo.org.br
TRANSPORTE | As linhas regulares de
ônibus e lotação que vão até a Zona Sul de Porto Alegre param em frente ao
prédio. É possível tomá-las a partir do centro da cidade ou em frente ao
shopping Praia de Belas. O retorno pode ser feito a partir do BarraShoppingSul,
por onde passam diversas linhas de ônibus com destino a outros pontos da
cidade.
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